segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

Ferreira Junior – Memória e Poesia em Guaratinguetá

O artigo tem como escopo uma sucinta analise acerca da produção do jornalista Ferreira Junior para a história de Guaratinguetá, de base positivista, cunho memorialista, objetivo, coloquial e literário, refletindo as raízes culturais e o caráter identitário de uma típica sociedade interiorana no decorrer de quase todo o século XX.

O jornalista Ferreira Junior nasceu em Guaratinguetá no dia 24 de agosto de 1890. Foi estudante primário do Colégio São Joaquim, na vizinha cidade de Lorena e desempenhou durante toda a vida as profissões de jornalista (autodidata) e tipógrafo.


No exercício do jornalismo foi fundador dos jornais Violeta (1908), O Norte de São Paulo (1915), O Eco (1929), O Rebate (1912) e a revista Sociedade. E ainda proprietário de uma gráfica na cidade, onde editou vários jornais de existência efêmera.  Entre eles, O Município, a Gazeta do Vale, O Garça, O Montanhês, o Piraquara, Garcinha, Folha de Lorena, e outros. 

E como cronista e poeta, publicou os livros: Essências da Vida (1961), Boa Noite Para Você (1962) e Trajetória (1968). Sua primeira poesia foi Oh Brasileira, escrita aos nove anos de idade. Representou sua cidade aclamada, Guaratinguetá, em vários concursos literários do país.

Foi orador, reconhecido como “de virtudes incomparáveis (...)” (MARCONDES, 1973:40)[1], tendo sido orador fundador da Associação Esportiva de Guaratinguetá.

Em 1966 foi homenageado pelo Centro Cultural “Eduardo Prado”, entidade cultural fundada em Guaratinguetá pelo Professor Jose Luiz Pasin, recebendo o Diploma de Honra pelas mãos do Cardeal de Aparecida, Dom Carlos Carmelo de Vasconcellos Mota (1973:41). Assim como consagrado pela Câmara Municipal de Guaratinguetá: “Patrimônio da Cultura” local. E homenageado na Escola de Especialistas de Aeronáutica, recebendo medalha e diploma de Honra ao Mérito.  
Juntamente com outros jornalistas, foi um dos fundadores da Associação Paulista de Imprensa e pertenceu à Associação Brasileira de Escritores. Foi presidente da Associação Beneficente de Guaratinguetá.
Deixou a vida jornalística em 1964, “vendendo suas oficinas e recolhendo-se a meditação” (1973: 40). Faleceu em 19 de novembro de 1969, na mesma cidade.

Resgatando a memória e poetizando o presente - “Poeta da Terra, Poeta da Pátria”
A poesia e toda a arte sempre se fizeram presentes na terra das “Garças Brancas”. Como afirma o próprio poeta, “Em todos os departamentos da atividade humana, há homens ilustres que tiveram por berço a cidade de Guaratinguetá”. E Ferreira Junior, por sua formação e experiência baseada na memória herdada e construída no decorrer dos anos, fez parte desses homens ilustres, destacando-se também como poeta, por seus versos e sonetos que conquistaram a cidade interiorana.
Essas palavras, “Poeta da Terra, Poeta da Pátria”, de autoria de Aydano Leite, ex- aluno e amigo do poeta guaratinguetaense, designam o quão o homem das letras exaltou os valores de sua terra e de sua gente, colaborando para a transmissão de uma cultura que na realidade poucos ainda percebiam, mas que precisa ser relembrada.
Segundo as palavras do amigo e escritor, Brito Broca, Ferreira Junior foi um “exemplo significativo de fidelidade à província”. Sabendo que somente nas grandes cidades metropolitanas fazia-se reputação literária, insistiu em permanecer em Guaratinguetá. Foi nesta cidade que o poeta desenvolveu sua atividade intelectual, tornou-se jornalista, escritor e poeta, trabalhando com a arte tipográfica, imprimindo seus próprios escritos. Ferreira Junior conseguiu destruir o tabu “Santo da terra não faz milagre”
“E contentou-se com a repercussão no âmbito provinciano, não querendo procurar lá fora uma gloria ilusória (...) Mas na sua modéstia, no circulo limitado em que tem gravitado, constituiu, sem duvida, uma bela expressão de dignidade literária, de amor desinteressado às letras”. (Brito Broca)
Desinteressado às letras porque não se preocupava com as inovações técnicas da poesia moderna, mantendo-se fiel a uma tradição remontada ao século XIX. Compunha seus versos líricos ao ritmo dos sentimentos, das emoções, sem outra preocupação se não a exaltação do íntimo.
(...) o Poeta recoloca na estante os velhos mestres, como Castro Alves e Guerra Junqueira, para encontrar-se a si mesmo. Sem nunca ter buscado a companhia de Casimiro de Abreu, o Autor afirma a sua personalidade de lírico. É o que se depara na ternura da sensibilidade dos seus melhores versos”. (Breno Viana)
Conhecido como poeta do otimismo, Ferreira Junior cria um mundo imaculado, tendo afinidade com as coisas doces e pulcras da vida. “A sua obra tem a impressionante beleza de elevação espiritual. Seus versos podem ser declamados inclusive entre monjas e noviças”. Um jornalista e escritor com marcas positivistas e um poeta lírico, suave e delicado. A sinceridade torna seus versos autênticos e espontâneos, e neles percebe-se principalmente o idealismo de um homem religioso, fruto do seu tempo e que durante sua vida de trabalho sempre encontrou na arte uma razão de ser.
Pessoas que tiveram a honra de conhecer esse escritor e de dividir com ele histórias e memórias de Guaratinguetá daquele tempo, podem considerar-se afortunados. Segundo ilustríssimo guaratinguetaense Tom Maia, formado em Ciências Jurídicas e Sociais, escritor e desenhista por excelência.
“Ferreira Junior foi um homem extraordinário, queria aparecer, escrevia, escrevia, escrevia. Era um homem poser (homem de postura). Ele amava a profissão e amava escrever e escrevia muito bem. Era um jornalista por excelência. A impressão que eu tinha era que ele gostava de mais de Guaratinguetá e queria falar sobre a cidade.”

Os temas explorados são variados, porém todos expostos com a suavidade característica do autor: saudade, amor, sonho, crianças, mulheres, santos, natureza, lembrança, exaltação, etc. Características marcantes, tanto em nível nacional como em nível local. Em nível nacional existe a poesia “Realidade”, em homenagem ao Presidente da Republica Humberto da Costa e Silva e ao amigo Juarez Távora, jornalista da grande imprensa.
“Não penso conhecer países de grandezas,
Nem mesmo ter noção de sua história a fundo;
Mas quero conhecer nas suas profundezas
A história do Brasil este país fecundo!

Do Amazonas ao Prata espero ver belezas;
As praias do nordeste, as mais belas do mundo!
Prodigiosas regiões de varias naturezas,
Imenso manancial do orgulho em que me inundo!

Só peço a Deus que inspire os homens do Poder,
No sentido de bem cumprirem seu dever,
No trabalho, na fé e no civismo térso.

Porque moralizar-lhe a economia enorme,
O Brasil que progride enquanto o povo dorme
Será ainda a maior potência do Universo!”

No âmbito local, a exaltação na poesia “Doce Enlevo”, que demarca o que Ricouer denomina como Lugar de Memória. E torna-se evidente na maneira com que o autor descreve o uso da memória individual que abrange a memória coletiva daquela sociedade, transformando a simplicidade do cotidiano dos garatinguetaenses em poesia.
“Nestas noites de calor
É a pracinha Conselheiro
Um refrigeiro, um primor,
Um logradouro fagueiro.
E vai pela noite a dentro,
A contagiante alegria,
Crianças brincando no centro,
Moças na periferia (...)”

E no âmbito mais intimo e individual o aspecto religioso dos seus escritos, refletindo um cidadão caridoso na sua cidade e devoto da Virgem Nossa Senhora de Fátima, tanto que fez uma poesia em sua homenagem:
“Acalentado ao peito a proverbial certeza de que naquele andor vai seu maior Troféu, A Virgem Mãe de Deus - que é Mãe dos pobrezinhos!”.

Como também nas poesias “O ateu crê em Deus” e “Orai e Vigiai!” demonstrando como a religiosidade era uma característica forte da sua personalidade. E uma herança da forte influencia da igreja no Brasil desde o período colonial. Notadamente nas principais famílias da cidade.
No aspecto educacional, como professor e intelectual, fez a poesia “Prenda Preciosa”, na qual destaca a importância que tem a educação.
“Uma das prendas mais sublimes desta vida
É a educação em toda a sua plenitude!
É a própria simpatia em gestos concebidos,
Franca, sincera, leal - de forma alguma ilude! (...)”

Nas duas obras poéticas “Trajetória” e “ Essências da Vida” o autor faz poesias de cunho histórico. “O Negro”, onde ele se posiciona contra a escravidão e critica essa fase da nossa história e “Tiradentes”, obra que revela a exaltação dos lideres da nossa história, destacando sua característica positivista e sua  religiosidade,
“Tiradentes é o nome imortal do Brasil!
É a maior expressão na estrutura da História!
Foi como Jesus Cristo ais travos de horda vil,
Mas que hoje as gerações entoam sua gloria!”
 O autor está inserido dentro dos escritores de um período em que houve uma mescla de jornalista, literato e memorialista. Portanto, com uma história vivida, uma Memória e um passado estruturado numa herança de glorias e feitos, legitimada pela sua e pela Memória dos outros, a qual passa para o papel, no objetivo de reiterar e perpetuar uma visão de mundo modelar.
E se constitui em parâmetro para repensar o modelo historiográfico atual, assim como para analisar o estreito laço entre história e literatura, que continuamente permanece na maioria das obras memorialistas tida como históricas e escritas em forma de prosa e narrativa. E que hoje parece serem tratadas como fontes privilegiadas para o estudo da cultura e da mentalidade regional.
Rafaela Molina 

2 comentários:

  1. Me chamo Rodney Roges Ferreira, popularmente Ney Ferreira, esse Ilustre e meu Amado Avo, convivi pouco com Ele, mas ele me ensinou muito, obrigado

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  2. Me chamo Rodney Roges Ferreira, popularmente Ney Ferreira, esse Ilustre e meu Amado Avo, convivi pouco com Ele, mas ele me ensinou muito, obrigado

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